Química
O mistério da
água
A descoberta de que
a água do cometa 67P, orbitado pela sonda Rosetta, é bem diferente da existente
na Terra enfraqueceu a teoria de que o líquido do nosso planeta tem origem
extraterrestre. Ao site de VEJA, astrofísicos e químicos explicam o que aconteceria
se alguém bebesse a água do cometa, quais são os tipos de água existentes na
natureza e qual pode ser, afinal, a origem desse elemento essencial à vida
No século VI a.C., o filósofo grego
Tales de Mileto afirmava que a água "está na origem de todas as
coisas". Mas foi somente no século XVIII que Lavoisier desvendou a
composição desse elemento: duas partes de hidrogênio para uma de oxigênio. A
química como conhecemos hoje, com a tabela periódica e a descoberta do
átomo, só se desenvolveu depois da segunda metade do século XIX. Desde
então, cientistas decodificaram as propriedades da água e seu papel
essencial para a existência de vida. A origem desse líquido, no entanto, ainda
é uma incógnita para a ciência.
Pelas crateras na Lua, os cientistas sabem que nosso planeta foi
intensamente bombardeado por corpos menores há 3,8 bilhões de anos, 800
milhões de anos após sua formação. Como a Terra era provavelmente muito quente
no início, uma das teorias é de a água tenha sido trazida pela colisão de
pequenos corpos celestes. A dúvida é quais foram esses corpos: cometas ou
asteroides?
Os cometas,
formados por 80% de água, eram a aposta preferida dos astrônomos. Já os
asteroides pareciam candidatos menos prováveis, uma vez que são essencialmente
rochosos, embora possuam água congelada, hidrogênio e oxigênio.
Uma das principais razões pelas quais a sonda Rosetta foi enviada em uma
cinematográfica missão ao cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko era verificar se a
água desse corpo celeste era a mesma da Terra. Um resultado positivo reforçaria
a teoria de que a água foi trazida até aqui pelos cometas. A teoria, no
entanto, perdeu força na última quarta-feira, quando um estudo publicado na revista Science mostrou que a água do 67P é diferente da
existente no planeta azul.
Leia também:
Missão Rosetta: por que o pouso em um cometa é tão
importante para a ciência
Missão Rosetta: novas imagens dão pistas do percurso de
robô em cometa
Composição da água — Toda molécula de água é composta por
dois átomos de hidrogênio e um átomo de oxigênio, a H2O como conhecemos,
mas a composição química desses átomos pode variar. O hidrogênio comum, mais
abundante na Terra, é formado por apenas um próton, com duas variações,
chamadas de isótopos (átomos de um mesmo elemento químico que diferem em massa).
Uma delas, o deutério, possui um próton e um nêutron, e a outra, mais rara,
possui um próton e dois nêutrons e é conhecida como trítio.
O mesmo acontece com o oxigênio. O mais comum, chamado oxigênio 16, tem oito
prótons e oito nêutrons, mas existem também o oxigênio 17 (com nove nêutrons) e
o oxigênio 18 (com dez nêutrons). Todos eles podem se combinar em 18
composições químicas diferentes para a água, que existem misturadas na Terra.
“Quando tomamos um copo de água, estamos tomando cada uma dessas misturas de
isótopos”, diz Fabio Rodrigues, professor do Instituto de Química e coordenador
de química do Laboratório de Astrobiologia da Universidade de São Paulo (USP).
Para determinar se a água de um corpo celeste é ou não parecida com a do nosso
planeta, os cientistas usam como base o deutério. Ele é um bom marcador porque
sua quantidade permanece estável mesmo ao longo de bilhões de anos. Assim como
se fazem testes de carbono 14 para determinar a idade de um fóssil, analisa-se
o deutério para saber de onde a água da Terra pode ter vindo.
Deutério — Medições do instrumento Rosina,
da sonda Rosetta, composto por dois espectrômetros de massa e um sensor de
pressão, mostraram que a H2O do cometa possui três vezes a
quantidade de deutério da água da Terra.
Os cientistas
estimam que a água do nosso planeta contenha 0,017% de deutério. No 67P,
esse valor é de 0,053%. A diferença é grande o suficiente para que os
pesquisadores tenham certeza de que os líquidos não têm a mesma origem, mas
pequena para que pudesse fazer mal a um humano essa água fosse consumida.
“Se, por exemplo, esse cometa caísse no reservatório Cantareira, em São Paulo,
sua água poderia ser consumida, pois a quantidade de deutério é ínfima para
alterar as propriedades da nossa água”, afirma Eduardo Janot Pacheco,
coordenador geral do Laboratório de Astrobiologia da Universidade de São
Paulo.
O problema é que outras substâncias foram encontradas no 67P. “A água poderia
ser consumida do ponto de vista do deutério. Você nem sentiria gosto algum,
porque deutério e hidrogênio são quimicamente idênticos, com apenas um nêutron
a mais no primeiro. No entanto, o cometa contém cianeto, amônia e outros
elementos não saudáveis. Então, pode não ser uma boa ideia beber essa água ou
refrescar o seu drink com suas pedrinhas de gelo", diz Kathrin Altwegg,
pesquisadora da Universidade de Berna, na Suíça, e principal autora do estudo
publicado na Science.
Leia também:
Parte da água do planeta pode ser mais antiga que o Sol,
diz estudo
Água é descoberta, pela primeira vez, na atmosfera de
exoplaneta do tamanho de Netuno
Em laboratório, é
possível fazer água em que todos os hidrogênios sejam do tipo deutério. Trata-se
da chamada água pesada, usada em reatores nucleares. Ainda assim, para nos
fazer mal, ela teria que ser ingerida em grande quantidade. “Para a água
composta apenas com deutério prejudicar o organismo, uma pessoa de 70 quilos
precisaria ingerir de 13 e 26 litros desse líquido, de modo que intoxicasse de
25% a 50% da água do organismo”, explica Fabio Rodrigues.
Outros cometas — O 67P não foi o
primeiro cometa a ter sua água analisada. Outras duas “famílias” de cometas, as
da Nuvem de Oort, mais distantes do Sol, e da família de Júpiter, mais próximas
do astro, também foram estudadas pelos cientistas. Os corpos celestes da Nuvem
de Oort mostraram uma quantidade de deutério muito alta. Na família de Júpiter,
o Hartley 2 possui água semelhante à da Terra na quantidade de deutério.
Curiosamente, a água do 67P, que também faz parte dessa família, revelou-se
mais parecida com os cometas da Nuvem de Oort.
"Seriam necessários diversos milhões de cometas para trazer água para a
Terra, e é pouco provável que a média de deutério dos cometas da família de
Júpiter seja parecida com a do nosso planeta, a não ser que o 67P seja uma
exceção e todos os outros tenham água parecida com a nossa", afima Kathrin
Altwegg.
Agora, a missão dos cientistas é investigar se a água veio de um
asteroide. Há uma semana, a agência espacial japonesa, Jaxa, lançou a
sonda Hayabusa 2, que percorrerá 300 milhões de quilômetros para chegar, em
2018, ao asteroide 1999 JU3, com objetivo de recolher amostras dele.
Paralelamente, a Nasa planeja para o ano que vem o lançamento da OSIRIS-REX,
com destino ao asteroide Bennu, para coletar amostras em 2019.
Se a teoria do
asteroide não se confirmar, ganharia corpo uma terceira hipótese: de que a água
teria se originado na formação da Terra. Nosso sistema planetário se
formou a partir de uma imensa nuvem de gás e poeira cósmica, que produziu
estrelas, planetas, asteroides, cometas e outros corpos celestes. "Pode
ser que nesse gás primordial a água já estivesse presente e, por isso, ela
aparece também em vários outros planetas do Sistema Solar. O mais provável é
que uma
mistura dessas três teorias indique a fonte da água terrestre. O planeta
foi formado com água e também bombardeado por cometas e
asteroides", afirma Eduardo Janot Pacheco. "Hoje se sabe que todas as
reações que criaram a vida ocorreram na água. Mas até hoje sua origem é um
mistério para a ciência.”
fonte veja

Pelas crateras na Lua, os cientistas sabem que nosso planeta foi intensamente bombardeado por corpos menores há 3,8 bilhões de anos, 800 milhões de anos após sua formação. Como a Terra era provavelmente muito quente no início, uma das teorias é de a água tenha sido trazida pela colisão de pequenos corpos celestes. A dúvida é quais foram esses corpos: cometas ou asteroides?
Uma das principais razões pelas quais a sonda Rosetta foi enviada em uma cinematográfica missão ao cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko era verificar se a água desse corpo celeste era a mesma da Terra. Um resultado positivo reforçaria a teoria de que a água foi trazida até aqui pelos cometas. A teoria, no entanto, perdeu força na última quarta-feira, quando um estudo publicado na revista Science mostrou que a água do 67P é diferente da existente no planeta azul.
Missão Rosetta: por que o pouso em um cometa é tão importante para a ciência
Missão Rosetta: novas imagens dão pistas do percurso de robô em cometa
O mesmo acontece com o oxigênio. O mais comum, chamado oxigênio 16, tem oito prótons e oito nêutrons, mas existem também o oxigênio 17 (com nove nêutrons) e o oxigênio 18 (com dez nêutrons). Todos eles podem se combinar em 18 composições químicas diferentes para a água, que existem misturadas na Terra. “Quando tomamos um copo de água, estamos tomando cada uma dessas misturas de isótopos”, diz Fabio Rodrigues, professor do Instituto de Química e coordenador de química do Laboratório de Astrobiologia da Universidade de São Paulo (USP).
Para determinar se a água de um corpo celeste é ou não parecida com a do nosso planeta, os cientistas usam como base o deutério. Ele é um bom marcador porque sua quantidade permanece estável mesmo ao longo de bilhões de anos. Assim como se fazem testes de carbono 14 para determinar a idade de um fóssil, analisa-se o deutério para saber de onde a água da Terra pode ter vindo.
Deutério — Medições do instrumento Rosina, da sonda Rosetta, composto por dois espectrômetros de massa e um sensor de pressão, mostraram que a H2O do cometa possui três vezes a quantidade de deutério da água da Terra.
O problema é que outras substâncias foram encontradas no 67P. “A água poderia ser consumida do ponto de vista do deutério. Você nem sentiria gosto algum, porque deutério e hidrogênio são quimicamente idênticos, com apenas um nêutron a mais no primeiro. No entanto, o cometa contém cianeto, amônia e outros elementos não saudáveis. Então, pode não ser uma boa ideia beber essa água ou refrescar o seu drink com suas pedrinhas de gelo", diz Kathrin Altwegg, pesquisadora da Universidade de Berna, na Suíça, e principal autora do estudo publicado na Science.
Parte da água do planeta pode ser mais antiga que o Sol, diz estudo
Água é descoberta, pela primeira vez, na atmosfera de exoplaneta do tamanho de Netuno
Outros cometas — O 67P não foi o primeiro cometa a ter sua água analisada. Outras duas “famílias” de cometas, as da Nuvem de Oort, mais distantes do Sol, e da família de Júpiter, mais próximas do astro, também foram estudadas pelos cientistas. Os corpos celestes da Nuvem de Oort mostraram uma quantidade de deutério muito alta. Na família de Júpiter, o Hartley 2 possui água semelhante à da Terra na quantidade de deutério. Curiosamente, a água do 67P, que também faz parte dessa família, revelou-se mais parecida com os cometas da Nuvem de Oort.
"Seriam necessários diversos milhões de cometas para trazer água para a Terra, e é pouco provável que a média de deutério dos cometas da família de Júpiter seja parecida com a do nosso planeta, a não ser que o 67P seja uma exceção e todos os outros tenham água parecida com a nossa", afima Kathrin Altwegg.
Agora, a missão dos cientistas é investigar se a água veio de um asteroide. Há uma semana, a agência espacial japonesa, Jaxa, lançou a sonda Hayabusa 2, que percorrerá 300 milhões de quilômetros para chegar, em 2018, ao asteroide 1999 JU3, com objetivo de recolher amostras dele. Paralelamente, a Nasa planeja para o ano que vem o lançamento da OSIRIS-REX, com destino ao asteroide Bennu, para coletar amostras em 2019.
fonte veja





Nenhum comentário:
Postar um comentário